domingo, 22 de abril de 2007

Não à Violência Doméstica e Familiar


A Lei Maria da Penha


Ao entrar em vigor a Lei 11.340, notei uma série de críticas em relação a mesma, o que já esperávamos, de certa maneira, em razão da amplitude das ações previstas, que certamente surgem para o desassossego de muitos, sobretudo àqueles mais “acostumados” com a violência doméstica contra as mulheres, mais ou menos como se, de inopino, todas as mazelas que ocorrem entre as paredes das residências pudessem ser reveladas , é como se, de um momento à outro, a casa deixasse de ser um asilo tão inviolável...

Como Coordenadora e Promotora das Promotorias Especializadas de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher na Capital do Estado de Mato Grosso ( Cuiabá) , vejo a lei como o início de um novo tempo, em que as mulheres oprimidas por toda ordem de violência ( física, moral e psicológica), poderá finalmente ter com quem contar, pois verá o seu caso, antes tido como tão irrelevante pelo direito penal ( crime de menor potencial ofensivo) , tratado com o devido respeito e consideração pelos operadores jurídicos.

Muito se falou sobre uma possível inconstitucionalidade da Lei 11.340/2006, o que de forma alguma possui argumentos que o justifiquem, já que a lei surgiu de uma antiga exigência de dois tratados internacionais assinados e ratificados pelo Brasil, que referem-se especificamente à promoção e defesa dos direitos das mulheres, quais sejam: A Convenção da Organização das Nações Unidas sobre Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher ea Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher,conhecida internamente como "Convenção de Belém do Pará”.

O parágrafo 2.º, do art. 5.º, da Constituição Federal de 1988, dispôs que os direitos e garantias expressos na Constituição Federal "não excluem outros decorrentes dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte", que dá margem à entrada ao rol dos direitos e garantias consagrados na Constituição, de outros direitos e garantias provenientes de tratados, revelando o caráter não taxativo do elenco constitucional dos direitos fundamentais,admitindo expressamente que tratados internacionais de proteção dos direitos humanos ingressem no ordenamento jurídico brasileiro no nível das normas constitucionais.

Assim, estudando atentamente a luta das mulheres contra a violência doméstica, somos obrigados a concluir que tudo convergiu para a promulgação da Lei 11.340/2006, ainda que tardia ( já que o Brasil é o 18º país da América Latina a efetivar uma lei com tais características).Não podemos mais ser omissos, temos que intervir em defesa dessas vítimas, implantando de fato, em todos os seus termos, a Lei Maria da Penha, que Impõe a necessidade de se criar, a exemplo do que ocorre em meu estado, Juizados ou Varas Especializadas para os Crimes de Violência de Gênero, a fim de que se possa oferecer serviços adequados à mulher que vive a situação de violência perpetrada pelo marido, companheiro, namorado, filho, pai e outros.

A violência de gênero, considera que as relações entre mulheres e homens têm sido historicamente desiguais, acarretando a subordinação da população feminina aos ditames masculinos que impõem normas de conduta às mulheres e as devidas “punições” ao descumprimento dessas regras. A idéia de gênero associada ao estudo da violência introduz ao tema sua dimensão histórica e política e, ao mesmo tempo, a modifica sua natureza, indicando ser possível a construção de uma convivência equilibrada, pacífica e democrática entre os sexos.

Dados das Nações Unidas apontam que 45% a 60% dos assassinatos de mulheres no mundo são cometidos por homens com quem elas tiveram algum envolvimento amoroso.A realidade da violência de gênero traz dados alarmantes sobre os números e suas seqüelas para a saúde física e mental, que também atingem os aspectos econômicos e sociais. Em São Paulo, uma mulher é assassinada a cada 24 horas, sendo o homicídio a principal causa mortis das mulheres entre 15 a 49 anos, na cidade (Proaim/SP). Sem dúvida, a intervenção do Estado, por meio de efetivação de políticas públicas adequadas, pode reduzir a tragédia da violência de gênero, propiciando possibilidades de impedir a manutenção da situação de desrespeito e violação dos direitos humanos.
Portanto, a Lei 11.340/2006 nada mais é que um mecanismo de discriminação positiva, que existe para proteção das mulheres vítimas de violência; sabemos que a lei demorou 05 anos para ser elaborada e foi objeto de discussões intensas, constituindo um verdadeiro instrumento de cidadania, que introduz perfeita consonância da lei ordinária com os dispositivos constitucionais vigentes, logo, não se podendo aceitar a pecha de inconstitucional e também não podemos analisá-la isoladamente, sem recorrer ao contexto histórico e sem ignorar que a violência de gênero faz parte de nossa cultura, posto que os superiores, via de regra, não são vítimas de agressão, logo, conclui-se que, historicamente, as mulheres são vistas por todos ( inclusive por outras mulheres e por si próprias), como seres inferiores em relação aos homens, mentalidade que precisa mudar, não a golpe de leis, mas através da educação.

Cabe a nós o desassombro de se fazer a verdadeira justiça, e deixarmos nossos preconceitos de lado, vez que invariavelmente entendemos como indiscutível a punição efetiva tão somente dos infratores patrimoniais, vez que quanto a estes há um consenso acerca da necessidade de exemplar punição, já que colocam em risco a tranqüilidade pública, quando na verdade, pesquisas e estudos revelam que as conseqüências da violência doméstica e familiar para as crianças e adolescentes que a presenciam, são nefastas, pois o menor, até como mecanismo de defesa, aprende a se “acostumar” com a violência( já que não pode combatê-la) e, quando adulto, via de regra , vai repetir esse padrão de comportamento, razão pela qual, ao nos omitirmos, estaremos simplesmente potencialmente criando delinqüentes para em tempo oportuno, podermos puni-los.

2 comentários:

Xisto Bueno disse...

Bela defesa da lei.
Abraços, Lindi.

Anônimo disse...

Muito bom,
muito bom mesmo...
bjs
kelly